sábado, 5 de novembro de 2011

Aix-en-Provence. Arte e cultura direto da fonte.

Uma das coisas mais incríveis do sul da França é a variedade de perfis de suas cidades. Quando cheguei a Aix-en-Provence, logo notei que se tratava de uma cidade bem maior que as outras da região. De fato, Aix possui cerca de 146.000 habitantes e, à medida que eu começava a descobri-la, ia ficando mais e mais impressionada com a riqueza de sua arte, história e arquitetura.

Não é para menos. Com mais de 2.000 anos de existência, Aix-en-Provence teve tempo mais do que suficiente para acumular um legado invejável. Some-se a isso uma sequência de boas administrações (algo que, diga-se de passagem, parece que levará pelo menos mais uns 500 anos para chegar aqui!), e pronto. Eis o segredo dessa cidade que integra o antigo e o novo na mais perfeita harmonia.

Vista da Cours Mirabeau - Foto: Simone Catto

Esquina da rue de Saporta com rue de Littera, Cidade Velha
Foto: Simone Catto

Aix-en-Provence nasceu no ano 122 a.C., quando os romanos abandonaram o planalto de Entremont para se fixarem na cidade, atraídos pela água generosa e abundante que brotava por sob suas terras. A partir daí, começou a se desenvolver como centro urbano e spa. Com a expansão do Cristianismo, Aix tornou-se diocese no século V e, posteriormente, sede do Arcebispado, tornando-se a capital da região.

Há tantas coisas interessantes para se ver na cidade, que seria insano listá-las todas aqui. Uma caminhada pela charmosa Cidade Velha revela, em cada esquina e cada ruazinha, um novo segredo e um pouco da história do lugar. Vamos a alguns deles.

A Torre do Relógio, antigo campanário da cidade e símbolo do poder comunal, foi erguida em 1510 e abriga um relógio astronômico de 1661 que possui quatro estátuas de madeira, cada uma representando uma estação do ano. A Torre do relógio é mesmo uma obra de arte e lembra algumas construções da cidade de Praga. Confira:

Torre do Relógio - Foto: Simone Catto

Hôtel de Ville (Prefeitura) foi instalado no século XIV aos pés da Torre do Relógio e sua fachada italiana foi construída entre 1655 e 1678 por Pierre Pavillon. Aposto que os funcionários da Prefeitura de Aix almoçam nos cafés da praça ou, pelo menos, dão uma parada estratégica por ali depois do expediente!

Place de la Mairie, com o Hôtel de Ville ao fundo - Foto: acervo pessoal

A fonte do Hôtel de Ville, esculpida no século XVIII por Chastel, possui quatro curiosas carrancas que cospem água, bem como uma coluna ao estilo romano no centro.  

Fonte do Hôtel de Ville - Foto: acervo pessoal

O antigo Palácio dos Arcebispos de Aix-en-Provence, localizado na atual place des Martyrs de la Résistance, mostra todo o poder político e religioso desses verdadeiros "príncipes" eclesiásticos, que faziam questão de habitar residências dignas de sua posição. Os prédios atuais foram erigidos entre 1650 e 1730, e o portal é atribuído ao escultor Toro. No primeiro andar, fica o Museu das Tapeçarias. Desde 1948, a praça do Palácio dos Arcebispos abriga as principais apresentações do Festival de Arte Lírica, realizado todo mês de julho.  

Palácio do Arcebispado - Foto: acervo pessoal

Na Place de l'Université funciona o Instituto de Estudos Políticos (IEP), que substituiu a antiga faculdade de Direito de 1409 e foi reconstruído em 1734 por Georges Vallon.

O IEP, na Place de l"Université - Foto: acervo pessoal

Local verdadeiramente mágico, a Place d’Albertas nasceu em 1745 por obra e capricho do riquíssimo marquês Jean Baptiste d’Albertas, que demoliu as casas em frente a seu palácio. Com decoração rococó, a praça é obra dos Vallon – pai e filho, que se inspiraram na moda das praças reais parisienses. A fonte no centro foi construída posteriormente, em 1912.

A Place d'Albertas, com sua fonte - Foto: Simone Catto

Quem vai a Aix não pode deixar de experimentar os calissons, deliciosos docinhos de amêndoas e frutas em formato de losango, típicos da região. Ainda na cidade velha, na rua Gaston de Saporta, há uma charmosa lojinha onde comprei os saborosos 'calissons du Roy René', batizados em homenagem ao rei mais querido da Provence. Ficam perfeitos acompanhados de um café!

Os calissons, uma tentação provençal - Foto: Simone Catto

Entrada da loja de 'calissons du Roy René' - Foto: acervo pessoal

Principal artéria de Aix-en-Provence, a Cours Mirabeau foi aberta no século XVII no lugar das antigas muralhas da cidade. As famílias mais importantes da nobreza construíram no local elegantes residências e, não raro, ostentavam seu poder com fachadas ricamente decoradas e lindos jardins.

Turistas e aixois se deliciam nos cafés da Cours Mirabeau - Foto: acervo pessoal

A Cours Mirabeau abriga diversas fontes, entre elas a Fontaine des Neuf Canons. Construída em 1691 por Laurent Vallon, ela substituiu um antigo bebedouro que servia aos rebanhos antes da construção do boulevard e tem algumas esculturas que não conseguimos enxergar devido à vegetação que tomou conta de tudo.

Fontaine des Neuf Canons - Foto: Simone Catto

Numa ponta da Cours Mirabeau está a Fontaine du Roi René, desenhada em 1819 por Pierre-Henri Revoil. A escultura do rei é obra de David d’Angers.

Mas quem foi esse rei tão querido que virou estátua e até marca de doce? Filho de Louis II de Anjou (o monarca que fundou a Universidade), René (1409-1480) também fez bonito em seu reinado, com uma administração eficiente que transformou Aix-en-Provence num centro artístico. (Aliás, estamos precisando desesperadamente de um rei René por aqui!!!)

Cours Mirabeau com a Fontaine du Roi René em 1o. plano - Foto: acervo pessoal

Contudo, a fonte mais conhecida da Cours Mirabeau e motivo de orgulho para todos os cidadãos 'aixois' é a majestosa Fontaine de la Rotonde. Construída em 1860, ela foi um verdadeiro marco local - não apenas por suas grandes dimensões, mas também por ser a primeira a ostentar uma bacia na parte superior. É adornada por três estátuas –  'Justiça', 'Agricultura' e 'Belas-Artes', simbolizando as principais atividades da cidade.

Place e Fontaine de la Rotonde - Foto: acervo pessoal

É fácil descobrir por que Aix tem tantas fontes. Não por acaso, seu próprio nome, 'Aix', vem da palavra latina 'aquae' - 'água'. Quando a cidade nasceu, em 122 a.C., o general romano Calus Sextius soube tirar proveito das abundantes fontes de água quente e fria da região para construir um conjunto termal. No império romano, foram construídos quatro aquedutos e diversas fontes, que desapareceram quando os bárbaros destruíram quase toda a cidade a partir do ano 480 d.C.

Na Idade Média, as fontes eram muito raras em Aix porque seus habitantes acreditavam que a água corrente trazia doenças.

Foi somente no século XV que Louis II, pai do amado rei René, permitiu a construção de fontes. Em 1412, sua esposa, a rainha Yolande, autorizou a cidade de Aix a desviar as famosas águas de Pinchinats, um bairro localizado a nordeste da cidade conhecido pela abundância de recursos hídricos naturais e que há séculos fornece água pura e fresquinha para seus habitantes.

O aumento considerável da população no século XVII estimulou o cardeal Mazarin a desenvolver a cidade. As fontes, então, adquiriram uma dimensão estética e passaram a embelezar ainda mais Aix-en-Provence.

Além de suas águas, fontes, história e beleza, há outro fator que tornou Aix famosa: lá nasceu Paul Cézanne (1839-1906), considerado por muitos o verdadeiro pai da pintura moderna. Cézanne passou sua juventude em Aix, bem como seus últimos vinte anos de vida.

Paul Cézanne, fotografado em 1904 por Émile Bernard em seu ateliê de Les Lauves, diante de um dos quadros da série 'Banhistas'

Do roteiro percorrido pelo artista, tive a oportunidade de visitar seu estúdio no chemin des Lauves, onde ele passou a trabalhar de 1902 até seus últimos dias e realizou obras importantes, tais como 'As Grandes Banhistas' (1900-1906), e várias pinturas da montanha Sainte-Victoire. O ateliê, que fica no alto da tranquila Av. Paul Cézanne, está exatamente como o artista o deixou ao falecer.

Interno do ateliê 'Les Lauves'

Vista externa do ateliê - Foto: Simone Catto

Uma noite jantei no Bistrot Romain - antigo 'Café Oriental' -, na Cours Mirabeau, também frequentado pelo mestre. Nos quinze minutos de espera por uma mesa, saboreamos, nas mesas da calçada, um delicioso champanhe rosé gentilmente oferecido pela casa. E as gentilezas não pararam por aí: já na mesa, antes de pedirmos as bebidas, o garçom nos ofereceu, como cortesia, taças do espumante frutado da casa. 

Abaixo está uma foto do Café Deux Garçons, na mesma avenida, outro ponto de encontro entre Cézanne e amigos fieis como o escritor Émile Zola.

Café Deux Garçons, na Cours Mirabeau - Foto: acervo pessoal

E para dar conta de tantas atrações, é preciso ficar bem instalado. Hospedei-me no apart hotel Adagio Aix-en-Provence Centre (www.accorhotels.com/pt-br/hotel-6796-adagio-aix-en-provence-centre/index.shtml) e o recomendo a todos. A localização, na 3-5 rue des Chartreux, é excelente, a poucos minutos a pé da Place de la Rotonde, da Cours Mirabeau e também da Cidade Velha. Tanto os quartos quanto os banheiros são amplos, bem modernos e confortáveis. E se o hóspede não estiver a fim de sair para comer, uma pequena copa equipada permite fazer refeições no próprio quarto. Além disso, o staff é solícito e gentil. Não tem erro!

É por essas e outras que Aix-en-Provence merece pelo menos uma semana para a gente conhecê-la melhor. Eu pretendo voltar, e muito em breve! Para mais informações, acesse o Escritório de Turismo da cidade: http://www.aixenprovencetourism.com/

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